Na reunião do GJOL do dia 08 de maio de 2023, foi debatido o livro ‘A Comunicação da Comunicação: As Pessoas são a Mensagem’, do português Gustavo Cardoso. As pesquisadoras Carolina Cerqueira, Andrezza Pessoa e Caroline Falcão foram as responsáveis pela exposição dos três capítulos do livro e pela elaboração do resumo a seguir:

Tomando por contexto o afastamento do modelo de comunicação de massa e a adoção da comunicação em rede, o livro defende que as transformações no âmbito digital (nas esferas de produção, distribuição e recepção) geradas pela nova configuração comunicacional já não permitem o encaixe na clássica afirmação de McLuhan de que “o meio é a mensagem”. Para Gustavo Cardoso, o foco, antes no canal, está agora centrado nos receptores e, diante disto, propõe uma nova sentença: “as pessoas são a mensagem”. Cara para o autor é a ideia de “mediação”, que seria proliferada no modelo de comunicação em rede (num cenário de crescimento exponencial de informações à disposição) de tal maneira a se tornar naturalizada no cotidiano das pessoas.

No contexto de mediação, Cardoso defende o importante papel dos receptores, não os definindo como passivos diante das plataformas mediadoras. Eles, portanto, moldariam a tecnologia para adequá-la aos seus objetivos, influindo no que os criadores desenham e inovam, além de darem usos diferentes às tecnologias, muitas vezes, não esperados por seus criadores. Para Cardoso, vive-se um modo de comunicação em rede no qual os indivíduos tornam-se eminentemente participantes, através das literacias que lhes permitem atuar em qualquer mídia e alterar a mensagem, desde tal seja a sua vontade. A mediação seria, portanto, o resultado das interações em rede, o produto de escolhas e opções dos sujeitos sociais.

Dessa forma, diante do protagonismo dos usuários visualizado por Cardoso, haveria o afastamento das ideias de McLuhan, que foca sua análise no papel do canal transmissor e sua capacidade de tornar os receptores dependentes ao ponto de causar a irrelevância da mensagem. Cardoso não descarta o importante papel do meio, mas o coloca como modelador da natureza da mensagem e, não, do seu conteúdo. Dessa forma, a transformação ao nível do conteúdo da mensagem não ocorreria por ação do canal, mas, sim, do receptor. De maneira prática, por mais que plataformas como o Twitter e o WhatsApp, por exemplo, tenham suas dinâmicas próprias e exijam dos usuários adaptações na maneira de comunicar, uma mesma ideia pode ser disseminada em todas elas, ficando o seu significado dependente da interpretação dada pelo receptor.

No contexto de adoção do modelo de comunicação em rede, proliferação de processos de mediação e foco no papel do receptor, Cardoso defende como consequência o que chama de erosão comunicativa a partir do enfraquecimento de três pilares base das instituições do sistema de mídia: a erosão dos mecanismos de classificação; a erosão do consenso democrático; e a erosão da reserva social.

A erosão da classificação destaca as novas camadas no processo de gatekeeping, com a proliferação de autoridades comunicativas. De um sistema focado em jornalistas e limitados meios de comunicação, passamos para um em que há múltiplos meios e uma multidão de participantes ativos que não apenas consomem conteúdos mas também os produzem. Quanto à erosão do consenso, a abundância de canais e conteúdos, a partir da ação conjunta de usuários e algoritmos, causaria a fragmentação e polarização do consumo, provocando desafios ao conceito de consenso democrático, erodindo, inclusive, a importância de um dos seus pilares: o jornalismo. Quanto à erosão da reserva (maior exposição individual), Cardoso destaca o importante papel dos dados, imbricando-os ao conteúdo das mensagens, já que algoritmos são capazes de determinar o que chega até nós e de que maneira chega. O autor defende que há um processo de naturalização do compartilhamento de dados (não mais com foco em vigilância), que servem como moeda de troca para o desempenho de tarefas cotidianas e funcionam numa lógica de recompensa num universo que chama de celebrização das redes.

Na segunda parte da obra, o autor oferece uma análise crítica do panorama comunicacional e estabelece alguns dos principais problemas que enfrentamos na atualidade. Cardoso refere-se a este conjunto de problemas como uma crise da comunicação, propondo várias estratégias para o enfrentamento dos desafios apresentados.

A crise é caracterizada pela ampla proliferação de notícias falsas, a queda da confiança nas fontes tradicionais de notícias e a saturação de informações e dados que circulam rapidamente através das redes sociais. Como exemplo, as Eleições Presidenciais dos EUA (2016), que foi amplamente marcada pela desinformação através das mídias sociais. O que, de acordo com o autor, pode ter contribuído para impactar significativamente a eleição de Donald Trump. E o referendo do Brexit, marcado por questões semelhantes.

Essas características e marcos ordenados ao longo do tempo, e devidamente caracterizados, ilustraram a argumentação principal no capítulo, de que a forma que utilizamos as redes criam câmaras de ecos, onde as pessoas consomem notícias que reforçam vieses cognitivos e crenças pessoais, muitas vezes marcados pelo preconceito, e, consequentemente, influenciando as pessoas a formar opiniões com base muito mais em emoções do que em fatos. Tornando necessário um letramento midiático coerente com a tecnicidade para identificar fake news, assim como uma nova forma de uso da internet com relação à promoção de notícias.

No capítulo três, Gustavo Cardoso trata da atuação do indivíduo na comunicação em rede falando sobre o seu papel central na escolha e na criação de conteúdo. Denominado por ele de “autonomia comunicativa”, sendo essas funções variáveis de acordo com o contexto e as habilidades comunicativas.

O autor também descreve as mudanças significativas na distribuição de conteúdo e o impacto na cultura e nas representações sociais. Para Cardoso, a comunicação em rede representa uma mudança significativa na forma como nos comunicamos e interagimos, sendo essencial no mundo contemporâneo, transformando práticas comunicativas e moldando nossa percepção da sociedade e cultura. Por fim, ele ressalta as culturas de acesso à nuvem que moldam novas representações e práticas comunicativas.