Pioneiro na informação on-line, Robert Cauthorn diz que barateamento da banda larga e telas portáteis de alta qualidade modificarão profundamente os jornais impressos, que em breve deverão sair apenas nos fins de semana. Segundo o responsável pela adaptação à web de jornais como o “San Francisco Chronicle”, premiado pela Newspaper Association of America como “pioneiro digital”, a geração nascida com internet prescinde de folhear as páginas impressas do jornal.
A mudança é só uma questão de os preços do “papel eletrônico” e das conexões sem fio chegarem a um nível acessível, disse ele na entrevista abaixo, dada ao “Le Monde”.

PERGUNTA – O “Yantai Daily”, na China, e o “Les Echos”, na França, estão fazendo experimentos com jornais que podem ser lidos numa simples folha eletrônica. Quando os jornais existirão apenas em formato digital?
ROBERT CAUTHORN – A revolução digital já está em curso. A hegemonia será dos suportes eletrônicos, que permitem o acesso a informações constantemente atualizadas.
É pouco provável que um adolescente de hoje, integrante da geração dos “digital natives” [nativos digitais], nascidos com internet, leia um jornal diário impresso quando chegar aos 30 anos. Tudo se acelera.
Já hoje, meu telefone 3G [de terceira geração] me permite acessar vídeos de 30 imagens por segundo e um grande número de textos, a qualquer momento e em qualquer lugar.
Os jornais impressos vão se tornar anacrônicos a partir do momento em que houver ampla disponibilidade de telas de alta qualidade e baixo preço e quando as conexões de banda larga e sem fio se generalizarem. Isso deve acontecer em menos de cinco anos nos EUA.

PERGUNTA – Quer dizer então que o jornal de papel vai desaparecer?
CAUTHORN – Um livro impresso sempre terá razão de ser, já que pode ser lido várias vezes ao longo de muitos anos.
Mas quais serão as vantagens do papel para um jornal? A força do hábito para muitas gerações de leitores e o conforto da leitura em folhas grandes, mais agradável do que a leitura na tela.
Mas tudo vai mudar com a chegada, após a generalização da banda larga, da tinta eletrônica e das telas flexíveis.
Para produzir um jornal de papel, árvores são cortadas, transportadas, transformadas em celulose e depois em rolos gigantes de papel que são transportados para gráficas.
Jornais são impressos, embalados, carregados sobre caminhões e depois descarregados nos pontos-de-venda.
Os consumidores os compram, os levam para suas casas e, depois, os jogam no lixo. Eles são recolhidos por caminhões e, na melhor das hipóteses, levados a centros de reciclagem.
Tudo isso guarda mais relação com a logística do que com a informação! Para um produto tão imediato quanto um jornal, esse desperdício é obsoleto.

PERGUNTA – Como as organizações de imprensa vão se adaptar?
CAUTHORN – Os jornais nunca foram precursores, mas o modelo econômico do jornal em papel, que já se encontra sob pressão há dez anos, será cada vez mais pressionado. Quase todos os jornais dos países desenvolvidos perdem dinheiro entre segunda e quinta-feira e são lucrativos apenas três dias por semana.
O leitor que compra seu jornal sete dias por semana praticamente desapareceu. Doze anos atrás, eu criei para o “San Francisco Chronicle” um dos cinco primeiros sites de informação na internet.
Dentro de 12 anos, duvido que os jornais impressos ainda sejam diários.
Dentro de cinco a dez anos vão surgir jornais impressos três dias por semana: às sextas e aos sábados e domingos.
Paralelamente, eles oferecerão informações na internet ou outras plataformas digitais durante sete dias por semana, 24 horas por dia.
O conteúdo desses jornais em papel será mais contextualizado, lembrando o das revistas atuais; os furos ou informações quentes já terão sido dados na versão digital.

PERGUNTA – Que conteúdo os jornais deverão propor?
CAUTHORN – Hoje os jornais oferecem uma informação generalista. Amanhã, terão que se adaptar aos universos diferentes dos leitores. Estes vão querer uma informação concisa e pertinente, que lhes seja entregue “on demand” [por encomenda].
Assim, os longos artigos narrativos sempre existirão, mas de maneira menos dominante.
Hoje mesmo as pessoas já têm a tendência a ler apenas os títulos. Dentro das próprias redações dos jornais, é difícil encontrar pessoas que lêem um jornal inteiro. Essa tendência vai se ampliar.

PERGUNTA – Os jornais se tornarão um produto de consumo amplo?
CAUTHORN – É claro que não! Uma paisagem feita de informações que respondem apenas à demanda seria deplorável.
Entretanto, para serem lidos, os artigos terão que ser ainda mais surpreendentes, em vista da enorme concorrência representada pela profusão de informações disponíveis. Os jornalistas terão que pensar de maneira diferente e se preocupar mais com seu público.
Há uma verdadeira revolução por vir. Hoje a maior preocupação dos jornalistas ainda é com os horários de fechamento e com a questão de fazer a informação sair o mais rapidamente possÍvel. O desafio é grande, mas o momento é apaixonante para o jornalismo.

PERGUNTA – Como vão evoluir os blogs ou o jornalismo cidadão e colaborativo? Estamos assistindo ao fim do quarto poder?
CAUTHORN – Não. Mas ele terá que aceitar compartilhar seu poder. Já hoje, nos EUA, blogueiros privados, que não têm o patrocínio de nenhuma instituição, gozam de tanta notoriedade junto ao público quanto os maiores editorialistas.
Até hoje as pessoas que controlavam os jornais eram aquelas que tinham voz de autoridade no debate público. Isso era algo inerente ao equilíbrio de poder entre a imprensa e as instituições. Essa divisão de papéis pertence ao passado.
Os blogs nunca vão tomar o lugar do jornalismo, mas vão continuar fazendo parte da paisagem. Quanto ao jornalismo cidadão, vai constituir uma maneira rápida e eficaz de revelar um acontecimento, mas nem por isso tornará obsoleto o jornalismo tradicional.
Apesar disso, não creio que esse tipo de jornalismo seja capaz de lançar luz sobre crimes ou temas políticos.
Para isso é preciso que se tenha acesso a determinadas fontes, e, sobretudo, é preciso contar com a proteção de uma instituição como um jornal.
Entrevista de Laure Belot Pascale Santi, publicada no “Le Monde” (Tradução de Clara Allain).

marcos palacios