Uma combinação de prepotência, ingenuidade e pura e simples ignorância tem provocado comentários dos mais variados na Blogosfera sobre neologismos, dinâmica da linguagem, pragmática e os limites da vontade e do poder empresarial. O detonador foi o recente episódio de uma carta enviada ao Washington Post por um representante do Google, sobre o “uso apropriado” do verbo transitivo “to google”, incorporado ao dicionário Merriam Webster, com o sentido de “to use the Google search engine to obtain information about (as a person) on the World Wide Web”
A rápida passagem da condição de não-entidade a nome de verbo de uso corrente, num período de apenas oito anos, deve ter subido à cabeça daqueles que fazem a política do Google. Agora eles acreditam que tem poder para definir como palavras podem e devem ser usadas pelos falantes, fixando limites do “pragmaticamente correto” para o caso.
Nem mais, nem menos…
Numa carta enviada ao Washington Post, o Google reclama contra o fato de que o jornal estaria usando o verbo em um sentido que o transforma em “marca genérica”. Ou seja, ampliando o sentido restrito de “buscar com Google”, para um sentido ampliado de “buscar com qualquer instrumento de mineração de dados disponível na Internet”. Como, no Brasil, Gillette virou “gilete”, Modess virou “modes” e “Band-Aid” virou “bandeide”, deixando de ser (apenas) marcas registradas para tornarem-se denominações de coisas, substantivos comuns.
A carta enviada ao Washington Post chegou ao cúmulo de indicar exemplos de “usos apropriados” e “não apropriados” do novo verbo:
Apropriado: He ego-surfs on the Google search engine to see if he’s listed in the results.
Não Apropriado: He googles himself.”
Apropriado: I ran a Google search to check out that guy from the party.
Não apropriado: I googled that hottie.”
Confrontado com o absurdo da situação, o Washington Post não se deu por achado e perguntou se seria apropriado que uma empresa avaliada em U$ 113 bilhões, usasse a palavra “hottie” em sua correspondência oficial. Naturalmente o Google poderia retrucar que a palavra está devidamente dicionarizada, no mesmo Merriam Webester, com o sentido de “pessoa fisicamente atrativa”.
Para evitar o risco de exposições ridículas desse tipo, empresas do porte do Google deveriam ter mais bom senso ao escolher seus porta-vozes para assuntos técnicos que extrapolem a criação e aplicação de algoritmos, campo em que eles – inegavelmente – são especialistas. O fato é que a arrogância do tom da carta e a patente ignorância que ela exuda quanto aos mais elementares princípios da dinâmica das línguas vivas vêm gerando uma enxurrada de postagens em Blogs. Na própria matéria do Washington Post há links para mais de 100 de tais comentários.
E o Washington Post não perdeu a chance de dar uma pequena cutucada final, assinalando que, surpreendentemente, a carta encaminhada pelo Google chegou em envelope subscrito à mão e foi entregue por correio postal tradicional….

marcos palacios